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    Capela Santo Sepulcro
     

    Capela Santo Sepulcro
     

    HISTÓRICO:

    O ano era de 1898, e Caxias do Sul ainda era um jovem município criado há recém oito anos, decorrente de uma das diversas colônias fundadas pelas levas de imigrantes italianos que continuavam a chegar à região desde o início do processo migratório ao Sul do Brasil, em 1875. Terra e barro ainda davam o tom às ruas da pequena localidade composta por construções de madeira e pedra, servindo de base para o movimento de carroças e cavalos que transportavam pela cidade as primeiras gerações de empreendedores que fariam de Caxias uma das mais pujantes metrópoles do Brasil em apenas algumas décadas. Como pano de fundo para toda essa atividade, a religiosidade trazida pelos imigrantes já se inseria como característica marcante do povo e do lugar, resultando no erguimento de capelas para atender aos anseios das comunidades que se formavam.

    Foi assim que, na região hoje conhecida como bairro Nossa Senhora de Lourdes, em uma rua que mais tarde viraria avenida e homenagearia um dos grandes heróis do Rio Grande do Sul, um grupo de senhoras deu início a um ritual que logo se transformou em tradição e resultaria no surgimento de um dos templos de fé mais significativos de Caxias do Sul, a Igreja do Santo Sepulcro, localizada na Avenida Júlio de Castilhos. Em frente ao local onde hoje situa-se a igreja, era realizada, semanalmente, uma feira destinada especialmente à troca de sementes entre os colonizadores. As pessoas que ali se reuniam aguardando a abertura da feira decidiram começar a rezar o terço, e a tradição instalou-se desde então, tendo sequência até os dias de hoje (atualmente, o rosário é rezado – conjunto de três terços – às quartas-feiras, a partir das 15h, o interior da igreja).

    Foi nessa mesma época, no final do século XIX, que o imigrante italiano Benvenuto Conte, então já instalado em Caxias do Sul, decidiu construir naquela localização uma pequena capela de madeira e chão batido, a fim de dar abrigo à religiosidade que movia os moradores das redondezas que se transformariam no bairro Nossa Senhora de Lourdes. Natural de Treviso, Conte era um homem muito religioso e, antes mesmo de chegar ao Brasil em uma das primeiras levas de imigrantes, em 1878 (apenas três anos após o início do processo de imigração), havia feito uma viagem à Terra Santa. Ao lado da sua moradia em Caxias do Sul, na atual Avenida Júlio de Castilhos, Conte decidiu construir um pequeno santuário, no qual empenhou-se em reproduzir o cenário que tanto lhe havia marcado ao visitar, em Jerusalém, a Igreja do Santo Sepulcro.

    Conte colocou literalmente mãos à obra e, mesmo não tendo experiência na arte da escultura, transformou em meta de vida criar na capela uma reprodução do Santo Sepulcro com figuras esculpidas em madeira-de-lei. Dessa forma, criou, em tamanho natural, dez imagens representando José de Arimatéia, a Virgem Maria, Maria Madalena, Maria Mãe de Thiago; um menino (que teria recolhido os cravos da crucificação), quatro soldados romanos e o Senhor Morto. Nesta última imagem, teve o auxílio de Pietro Stangherlin, que se responsabilizou por esculpir o rosto e as mãos. Com exceção do Cristo Morto, todas as imagens têm pernas e braços articulados. As imagens foram organizadas em uma cripta no interior da capela desde os primórdios da edificação.

    Em 31 de janeiro de 1937, foi inaugurada a atual edificação da capela, construída em pedra e tijolos maciços, com pilares marcados em relevo e aberturas em forma de ogivas que a caracterizam como representante do estilo neogótico. Ela possui uma única torre, que serve de campanário, encimando o centro da fachada. A nova igreja, substituindo a antiga capela em madeira, foi construída atendendo a um pedido feito por Benvenuto Conte em seu leito de morte à filha Genoveva Conte Pierucini. Com a ajuda da comunidade e do arquiteto Luigi Vallera, a atual Igreja do Santo Sepulcro contou, em sua inauguração, com a presença do bispo Dom José Barea.

    Com o passar dos anos, algumas das características originais do templo foram sendo alteradas, como a cobertura de telhas francesas, que foi substituída pela de zinco atual; os ladrilhos hidráulicos da cripta, que hoje possui lajotas de cerâmica) e os lustres de vidro de Murano, que acabaram trocados por lâmpadas fluorescentes. Mas a atmosfera intimista, que convida à reflexão e à oração, permanece dando o tom e estabelecendo a personalidade da capela, quer foi declarada Patrimônio Histórico Municipal em 30 de julho de 2006, em decorrência do acervo artístico que abriga e de suas características arquitetônicas singulares.

    Uma visita nos dias de hoje à Igreja do Santo Sepulcro, além das motivações religiosas, proporciona também um amplo momento para a apreciação da melhor arte sacra já gerada na região. Além das esculturas feitas por Benvenuto Conte, é possível apreciar duas figuras esculpidas em gesso em 1938 por Michelangelo Zambelli (santeiro afamado na região na primeira metade do século passado): a Nossa Senhora das Dores e o Nosso Senhor dos Passos. As laterais do templo são ornamentadas por um belo conjunto de 14 vitrais representando cenas da Via Sacra, elaborados pela empresa Hans Viet & Cia., de Porto Alegre.

    Outra grande atração artística da igreja é o Afresco da Ressurreição pintado em 1952 pelo artista italiano Aldo Locatelli, famoso por ter se radicado no Rio Grande do Sul e realizado pinturas no interior da Igreja de São Pelegrino, um ano antes. O afresco encontra-se aos fundos do altar da Igreja, como que fazendo um elo narrativo entre o sepulcro que guarda o Senhor Morto com as esculturas de Benvenuto Conte, na cripta, remetendo à posterior ascensão de Jesus aos céus. A pintura de Locatelli representa cinco personagens: três soldados romanos, um anjo e Jesus Cristo. O afresco foi concebido em formato triangular, acompanhando o estilo da arquitetura gótica do templo.

    Além do rosário rezado todas as quartas-feiras, uma das cerimônias mais antigas e tradicionais realizadas na Igreja do Santo Sepulcro, e que permanece ativa, é o ritual do Beijo do Senhor Morto, realizado na Sexta-Feira Santa, reunindo centenas de fiéis.

    *Texto de Marcos Fernando Kirst